quarta-feira, 29 de junho de 2011

Eu me dei uma chance de ver Glee

Todo mundo falando, postando, curtindo, e eu, de início por puro preconceito, resistindo. Era assim com Glee. Até essa logo me irritava, justamente pela referência aos loosers, um dos clichês americanos que mais me irritam.


Depois vi uns episódios aleatórios, na tv, e aí não era só preconceito. Achei bem clichê mesmo, e ainda pensei que os caras tinham achado a fórmula mágica de fazer um filme de high school que podia não acabar nunca. A cara dos americanos. Mas depois de ver um vídeo do musical com a Gwyneth Paltrow que mistura Singing in the Rain com Umbrella fiquei mais a fim de ver qual era a de Glee.

O convencimento total veio deste post que recebi de um amigo. Embora eu nunca vá dizer o nome dele. :)


Por aqueles dias, eu e minha amiga usamos uma música velhinha do Roberto Carlos numa aula que damos pra jovens (entre 17 e 19 anos). Eles mais ou menos torceram o nariz pra música, e nós falamos do preconceito que também tínhamos com o Rei quando éramos adolescentes. Eu mesma detestava, chamava solenemente de o Rei do Brega e tals. Mas hoje em dia ouço primeiro uma música, vejo qual é, e nem da própria figura do cantor, apesar de tudo, eu tenho mais aquela imagem tão ruim de antes.

O que isso tem a ver com Glee?

O fato de que a gente pode, sim, e na verdade deve, olhar melhor pra uma coisa que, de início, parecemos desprezar, como diz o Moura, autor do post. Porque pode ser que a gente é que ganhe.


Foi o que aconteceu comigo e Glee.

Não só curti, mas viciei.

No início, só achei que não era mesmo aquele clichê todo que tinha imaginado e que valia a diversão. Afinal, por que é que tudo tem que ser só culto e cheio de conteúdo o tempo todo? Mas com o tempo até essa visão vem mudando. Porque, apesar do ritmo e da direção bem divertidas, que tornam leves os assuntos de Glee, e apesar de todos os romances típicos das novelinhas adolescentes, o Glee não é fútil. Pelo menos não o tempo todo.


Algumas das coisas de que mais gosto:


A primeira é o fato de estar cheio dos clichês próprios das high schools americanas (sei lá o que representa esse período pra eles, nunca morei nos States nem convivi com americanos, e aqui no Brasil - graças a Deus! - a gente não tem isso, ninguém fica o resto da vida lembrando de como era no segundo grau nem essa época marca tanto assim a gente, mas sei que deve ser muito importante pra eles, dada a quantidade absurda de filmes sobre o assunto, inclusive os que fazem os protagonistas voltarem pra escola!), enfim, está cheio dos clichês, mas subverte-os o tempo todo. Às vezes, é pela caricatura mesmo. Os personagens mais vilões, como a Sue, treinadora dos líderes de torcida, e a Terri, (ex) mulher do Shue, têm uma atuação (e uma direção, claro) mais caricata, decerto pra amenizar as maldades, que tem hora que são brabas - como derrubar a enfermeira idosa da escola pela escada, por exemplo. E essa caricatura, quando não é pela atuação, pode ser pelo figurino: as líderes de torcida não tiram aquele uniforme ridículo nem pra jantar num restaurante legal. Parece meio desenho animado, história em quadrinhos. Quer dizer, o que de início parece a razão pra não gostar do Glee é, no fundo, o que atrai pra ela, se a gente olhar com atenção. Os clichês estão ali pra serem questionados mesmo.


Mas na maioria das vezes essa subversão vem nos fatos. Quando o pai do Kurt apareceu pela primeira vez, eu já falei: vixe, é o maior caretão, bruto, vai infernizar o filho. Mas quando Kurt conta que é gay, a resposta é totalmente inesperada. Toda hora você é desmontado por uma sequência que não imaginava.


Outra coisa muito legal é que não tem aquele mundinho cor-de-rosa do High School Musical. Os caras fazem um esforço danado pra trazer os jogadores de futebol e as líderes de torcida pro coral (o glee), eles curtem muito, mas continuam morrendo de vergonha. E são sacaneados pelos outros jogadores, mesmo quando continuam no time. Quer dizer, não tem aquele universo ideal em que todo mundo compreende as diferenças, respeita todas elas e se tolera depois de uma grande revelação! Nada disso. Um cara que jogava os outros na lata de lixo depois passa a ser jogado só porque perdeu o moicano. E, quando o cabelo cresce, ele mesmo volta a fazer com os outros o que tinham feito com ele. Isso parece reforçar o sistema, mas o que faz é ridicularizá-lo ainda mais, com base na sua própria inconsistência. Escancara que o que é popular ou perdedor, nas escolas americanas, são os estereótipos e não as pessoas que os representam em dado momento. Ao contrário de todo filme sobre o assunto que a gente já enjoou de ver.


Eventualmente algum personagem compreende que tem de mudar mesmo de atitude, de modo definitivo. Mas isso é gradual e todo mundo pode ter recaídas. Ou seja, os personagens, por mais caricatos e clichês que sejam, são densos, têm conteúdo, ninguém é totalmente mau ou bom, inocente ou vagabundo, cruel ou amoroso. A Sue ama, o Shue sacaneia, a Rachel é uma mocinha insuportavelmente egocêntrica, o Finn é um cara legal mas quer ser popular, o Kurt defende seus direitos mas é arrogante, a Quinn é fútil mas ajuda a Mercedes...


E ontem eu assisti a um episódio que me fez respeitar muito mesmo a série.

Já tinha tido um assim na primeira temporada, que é quando a gente conhece a irmã da Sue. Além da surpresa em si, a cena é ótima. A diferença na expressão facial da atriz (Jane Lynch) é mínima: a gente vê ali o amor pela irmã, mas não some totalmente a ironia e a crueldade que ela sempre externa.

Mas neste da segunda temporada, o Finn chama o Kurt pra dançar na festa de casamento. Achei muito, mas muito significativo mesmo. Você imagina um garoto de 16, 17 anos vencer preconceitos tão fortes e dançar com outro, e feito de uma maneira muito real, muito convincente. Tudo depois de altos vacilos na defesa do menino contra o valentão da escola, por causa de uma necessidade de ser popular. Foi a cena de que mais gostei em toda a série, até agora.

Se nada mais tivesse valido, valeria por ela. E eu já tinha achado isso no episódio sobre as deficiências, lá na primeira.

Taí. Se alguém tem preconceito contra Glee e, como eu, quer ver qual é, pode escolher um desses dois episódios, o "Wheels", da primeira temporada, e o "Furt", da segunda. Até o nome do episódio é maneiro, não?

Se não vir toda essa densidade que eu vi, pelo menos vai se divertir bastante. Tá certo que tem muita música brega. Mas gosto cada um tem o seu. E mesmo algumas músicas bregas às vezes pegam a gente de jeito. Taí o Roberto Carlos que me deixa mentir.

3 comentários:

Daniela disse...

Ah, eu adoro! Geralmente meu gosto pra séries não bate com o que meus amigos andam assistindo, mas eu gosto do que gosto e pronto. E Glee é demais. Essa segunda temporada foi um arraso...
Bjs!

Anônimo disse...

O último que vi, no meu arquivo da segunda temporada, foi o das camisetas com o que eles não gostam em si mesmos. Achei tão legal, e tão Glee, de sério e profundo, e tão não Glee, de sério e profundo, que ainda não voltei pra assistir aos próximos. Um pouco, claro, por causa do sono. Mas fiquei pensando o que eu escreveria na minha camiseta, aos 15, 16 anos. =)

Tatiana disse...

Vixe, nem pensei nisso. E aos 42?

Pra não ser estraga-prazer!

No começo, eu evitava falar das tramas dos filmes, livros e séries que comento aqui, mas isso limita muito e, com o tempo, dei mais liberdade às minhas postagens.
Porém, como eu não gosto que me contem as histórias, como eu adoro as surpresas que os criadores geralmente nos preparam com tanto esforço, não quero estragar o prazer de ninguém.
Se você é como eu, melhor ler ou ver antes. Mas convido-o a voltar depois, pra saber o que eu achei.